Às vezes em sala de aulas,
em conversas com meus alunos, tenho um hábito de estar sempre lhes questionando
sobre assuntos do cotidiano, que contadores e mui especialmente estudantes de
contabilidade, indagam:
Que
isso tem a ver com a contabilidade e seus estudos?
Normalmente,
provoco-lhes com uma outra questão:
E
o que não tem a ver com a contabilidade?
Penso
que só não tenha a ver com a contabilidade, assuntos que não façam nenhuma
relação com o comportamento patrimonial das organizações. Mas, óbvio, diante
das minhas limitações, não consigo enxergá-los. Ou seja, sempre vejo os
assuntos impactando de uma forma ou de outra o patrimônio das entidades. Daí,
sem chance, está a contabilidade ali também.
Pois
é, isso permeou intensamente meus pensamentos sempre que acompanhei as
notícias/matérias sobre o maior conclave mundial acerca do meio ambiente,
ocorrido nas duas últimas semanas no Brasil. A Rio+20. Seja na parte oficial,
seja nos eventos paralelos, estava lá a Contabilidade, fazendo parte de tudo,
visto por mim como se fosse uma obsessão. Até porque, nada foi mais
intensamente referenciado, discutido, evidenciado, do que o patrimônio mundial
(e, por conseguinte das organizações), em termos de riscos tenebrosos e
possíveis ganhos.
E como seria a
evidenciação disso tudo e sua accountability?
Também nesses dias, em
minhas leituras, deparei-me com um texto bastante interessante que de certa
forma, demonstra o quanto já se estuda seriamente sobre essas questões no
âmbito puro da contabilidade. Isso é feito no Necma (Núcleo de Estudos em Contabilidade e
Meio Ambiente), liderado pelo Professor da USP, Roberto Kassai. Ou seja, melhor
vocês conferirem o texto abaixo publicado na edição on line do Jornal Contábil.
Leiam:
Balanço
verde é alvo de nova contabilidade
Um novo tipo de balanço
contábil para empresas e governos desponta para colocar os danos ambientais ou
sociais na coluna de “passivos”, enquanto as ações compensatórias seguem para a
coluna de “ativos”, ambos ao lado de resultados financeiros e patrimoniais.
É o que explica José Roberto
Kassai, professor da USP (Universidade de São Paulo), que lidera mais de 50
pesquisadores de múltiplas áreas e também parcerias de empresas, governos e
instituições no Necma (Núcleo de Estudos em Contabilidade e Meio Ambiente) .
“Ainda parecem duas áreas
distintas, mas é uma mudança cada vez mais evidente”, afirma ele, ao citar como
exemplo os ativos como florestas, terras produtivas ou capacidade de absorção
de carbono em oposição aos “gastos” como as queimadas ou as mudanças
climáticas.
Tópicos básicos / O novo
sistema de balanços pesquisados pelo grupo tem quatro eixos principais:
- Econômico,
- Social,
- Ambiental e
- Governança.
“O futuro crescimento do mercado de capitais deve colocar a maioria das empresas nas mãos da sociedade,
que vai exigir transparência”, diz.
Dessa forma, os resultados
financeiros serão tão importantes como a geração de empregos com equilíbrio de
gênero, étnia e renda no lado social. E a prevenção de danos ao meio ambiente
estará junto ao controle interno. E com prestação de contas.
“O José Goldemberg, que é um
Nobel do meio ambiente, aponta os cinco desafios atuais como mudarmos o PIB
[soma de geração de riquezas], acabar com subsídios de energia, reduzir o
crescimento populacional, preservar a biodiversidade e elevar o conhecimento
sobre nosso rumo”, afirma.
Movimento global / A
estrutura de aplicação dos quatro eixos da nova contabilidade foi desenvolvida
em contatos com movimentos empresariais como o Instituto Ethos e o IBGC
(Instituto Brasileiro de Governança Corporativa), além de referências
internacionais como o GRI (Global Reporting Initiative), que reúnem boa parte
das grandes empresas brasileiras e multinacionais.
“Essa discussão ética
implica envolver todos os ‘stakeholders’, ou seja, administradores,
fornecedores, governos, investidores, clientes, comunidade e outros”, define.
Mas existe pressa, porque o balanço global é de perdas para o meio ambiente.
Jundiaí
tem bônus para o cálculo
O trabalho desenvolvido
desde 2005 pelo Necma, ligado à Faculdade de Administração, Economia e
Contabilidade da USP, usou as metodologias da nova proposta contábil para
apontar o Brasil entre os raros saldos positivos dos “monster countries”, nome
do grupo que forma ao lado de outros grandes países em extensão territorial do
mundo ao lado de Estados Unidos, China, Índia e Rússia.
Um segundo trabalho,
analisando os estados brasileiros, começou em 2008 e está sendo divulgado agora
e comprova um dos motivos dessa situação. Os estados da Amazônia, que abriga a
maior cobertura florestal do planeta, lideram o balanço verde.
“Nosso desafio é colocar no
passivo as questões ligadas com a pobreza e falta de infraestrutura das
populações. Ainda não está claro quanto vale uma árvore em pé, e muito menos
uma floresta inteira”, explica Kassai.
A próxima etapa, mais
complexa, é o trabalho a nível de municípios ou até mesmo regiões. E Jundiaí é
um dos alvos pretendidos pelo pesquisador. Um dos motivos é o bônus visível que
a cidade abriga com a conservação de áreas como a Serra do Japi e zonas de
mananciais.
“Tenho mantido contatos com
a Diretoria de Meio Ambiente da administração municipal. Precisaremos buscar
parcerias para viabilizar profissionais como biólogos, climatologistas,
sociólogos e outros especialistas. ”,
diz.
As variantes que desafiam as
equações definitivas são a diversidade biológica (de plantas e animais em cada
bioma) e o processo de emissão ou absorção de carbono.
Um consenso sobre novos
tipos de contabilidade pode facilitar, por exemplo, um mercado de pagamentos de
serviços ambientais para remunerar áreas que conservem a vida natural ou a
geração de água.
Obras /Além da USP, o
trabalho tem parceiros na Unicamp (Universidade Estadual de Campinas) com
métodos que podem ajudar o cálculo de impacto urbano, ambiental e de vizinhança
de novas obras.
Jornal Contábil – Edição on-line